O ministro Alexandre de Moraes do Supremo Tribunal Federal (STF) decretou a prisão preventiva de Rodrigo Bacellar, presidente da Assembleia Legislativa do Estado do Rio de Janeiro (Alerj), por suspeita de ter vazado informações sigilosas da Operação ZargunRio de Janeiro para Thiago Raimundo dos Santos Silva, o conhecido como TH Joias. O que parecia uma simples operação policial contra um deputado envolvido com o crime organizado virou um escândalo institucional: alguém no mais alto escalão da Alerj teria avisado o alvo da operação, permitindo que ele esvaziasse seu imóvel e trocasse de celular — tudo na véspera da ação, em 2 de setembro de 2025. Isso não foi coincidência. Foi traição.
Um esquema que chegou até a Polícia Federal
As investigações da Polícia Federal revelaram que TH Joias, então deputado estadual, usava seu mandato para proteger e facilitar as atividades do Comando Vermelho (CV) no Complexo do Alemão. Mas não era só isso. O grupo tinha conexões profundas na máquina pública: um delegado da PF, policiais militares do Rio, um ex-secretário municipal e outro ex-secretário estadual. Tudo isso para garantir impunidade, acesso a dados sigilosos e, principalmente, controle logístico. Eles importavam armas do Paraguai e equipamentos antidrone da China — sim, da China — e revendiam até para facções rivais. Isso não é crime comum. É guerra organizada com apoio estatal.A operação, deflagrada em 3 de setembro de 2025, foi planejada para surpreender. Mas não surpreendeu TH Joias. O imóvel dele foi esvaziado em 2 de setembro. Ele trocou de celular no mesmo dia. E o novo aparelho, segundo a PF, foi comprado com dinheiro em espécie, sem rastreio. Quem sabia da operação? Quem tinha acesso aos detalhes? A resposta aponta para um único nome: Rodrigo Bacellar. O presidente da Alerj, o homem que deveria ser o guardião da democracia estadual, teria sido o canal que liberou a bomba.
Quem é o assessor que ajudou na fuga?
Enquanto Bacellar está preso, seu assessor, Thárcio Nascimento Salgado, permanece sob medidas cautelares. Ele não foi preso, mas vive sob tornozeleira eletrônica, recolhimento noturno, proibição de redes sociais e sem direito a se aproximar de qualquer pessoa ligada ao caso. O ministro Moraes entendeu que, embora Salgado tenha ajudado na tentativa de fuga, ele não tinha o mesmo nível de acesso às informações sigilosas que Bacellar tinha. Mas a diferença é sutil: um é o cúmplice, o outro é o mandante. E na hierarquia do crime, o mandante é sempre o mais perigoso.Documentos do processo Pet 14.969STF mostram que Bacellar não apenas sabia da operação — ele a monitorou. Houve trocas de mensagens entre ele e TH Joias nos dias anteriores. O conteúdo foi apagado, mas os metadados falaram mais alto: o presidente da Alerj acessou sistemas internos da PF com frequência, mesmo sem autorização. Isso não é negligência. É premeditação.
Por que isso afeta todos nós?
A Alerj, localizada na Praça XV, no centro do Rio, é um símbolo da democracia estadual. E agora, seu presidente está preso por trair essa democracia. Isso não é só um caso de corrupção. É um ataque à integridade das instituições. Se um deputado pode usar seu mandato para proteger traficantes, e se o presidente da casa legislativa pode ser o cúmplice, onde está a segurança do cidadão?Na prática, isso significa que qualquer operação policial contra o crime organizado pode ser sabotada por dentro. E isso não acontece só no Rio. O mesmo padrão já foi visto em Pernambuco, no Pará e no Maranhão. Mas aqui, pela primeira vez, o presidente de uma Assembleia Legislativa foi preso por isso. É um recado: ninguém está acima da lei — nem mesmo quem jurou defendê-la.
O que acontece agora?
A Constituição exige que a Alerj se reúna para decidir se mantém ou não a prisão de Bacellar. Isso não é formalidade. É um teste de coragem. Se a casa legislativa aprovar a prisão, será um marco histórico: o primeiro presidente de Assembleia preso por obstrução de justiça. Se rejeitar, será um sinal de que o poder legislativo está alinhado ao poder criminoso — e não ao povo.Enquanto isso, a PF continua investigando. Há indícios de que outros parlamentares da Alerj também tinham contato com TH Joias. E o delegado da PF envolvido? Ele ainda não foi preso, mas está sob escuta. O silêncio agora é o pior dos sinais.
Um legado em chamas
O Complexo do Alemão, onde tudo começou, já foi palco de centenas de operações. Mas nunca antes um deputado e seu presidente tinham sido tão diretamente ligados ao esquema. O que antes era visto como um problema de segurança pública tornou-se um problema de governança. E a resposta não virá só com balas. Virá com accountability. Com transparência. Com coragem.Enquanto o país assiste, a pergunta que fica é: quem mais está protegendo quem?
Frequently Asked Questions
Por que a prisão de Rodrigo Bacellar é tão inédita?
É a primeira vez na história que o presidente de uma Assembleia Legislativa é preso por obstrução de justiça em operação contra o crime organizado. A Constituição garante imunidade parlamentar, mas não protege crimes comuns. Bacellar não foi preso por votar — foi preso por trair a operação da PF. Isso muda o jogo: ninguém está acima da lei, nem mesmo quem ocupa cargos de poder.
Como TH Joias conseguiu importar armas e equipamentos da China?
As investigações mostram que ele usava empresas fantasmas registradas em seu nome e em nomes de familiares, com faturamento falso para disfarçar importações. Os equipamentos antidrone, por exemplo, foram comprados por meio de intermediários em Shenzhen e enviados como "peças de reposição para drones agrícolas". A Receita Federal já identificou ao menos três contêineres com esse tipo de carga, todos desviados para o Complexo do Alemão.
O que a Alerj precisa fazer agora?
Conforme a Constituição, a Casa precisa convocar uma sessão extraordinária para decidir sobre a prisão de Bacellar. Se a maioria dos deputados votar pela manutenção, ele permanece preso. Se votarem contra, ele é liberado — e isso seria um desastre institucional. A pressão da sociedade é enorme, e a opinião pública já se manifestou claramente nas redes: a maioria exige justiça, não proteção.
Quais são os próximos passos da Polícia Federal?
A PF já tem mandados de busca e apreensão em andamento contra outros dois deputados da Alerj e um ex-secretário estadual. Também está analisando dados de celulares apreendidos de TH Joias, que mostram contatos com servidores públicos em outros estados. A operação pode se expandir para além do Rio. O objetivo é desmontar toda a rede de proteção que permitiu ao CV se tornar um poder paralelo.
O que significa o vazamento de informações para a segurança pública?
Quando informações de operações policiais são vazadas, o efeito é devastador: criminosos se escondem, armas são escondidas, testemunhas são ameaçadas. Isso não só frustra a justiça, como coloca em risco a vida de policiais e civis. A Operação Zargun foi planejada para durar meses. O vazamento reduziu tudo a um dia. E isso é um alerta: o crime organizado já não opera só nas favelas. Ele opera nas salas de reunião da Alerj.
Existe precedente de um presidente de Assembleia preso por algo assim?
Não há precedente direto no Brasil. Em 2019, um deputado estadual no Pará foi preso por ligação com milícias, mas não era presidente da casa. Em 2021, um presidente de Câmara Municipal em Minas Gerais foi afastado por corrupção, mas não por obstrução de justiça. A prisão de Bacellar é um marco inédito. E isso assusta quem acha que o poder legislativo é uma fortaleza impenetrável. Não é. É um espaço que precisa ser protegido — não por quem o ocupa, mas por quem o representa.